MEMÓRIA EM QUADRINHOS: O dia em que Wolverine foi curtir o Carnaval no Rio de Janeiro
Esquidum, esquidum, esquidum. Como recentemente passamos por um período carnavalesco, em plena pandemia da covid, pensei em lembrar da pitoresca primeira história em que o mutante mais famoso da Marvel, o Wolverine, pisou no Brasil, em pleno Carnaval.
Essa HQ foi publicada no one shot Wolverine: Black Rio nos EUA, em 1998. No Brasil, foi traduzida como Wolverine: Rio de Sangue e publicada pela extinta editora Pandora, em 2001. O início dos anos 2000 foi um período um tanto estranho para o mercado de quadrinhos Marvel e DC no Brasil, porque foi a época da transição da Abril para a Panini, e a linha de super-heróis Marvel e DC foi quase pulverizada naquela época. Houve algumas editoras que comiam pelas beiradas, e a Pandora era uma delas. Ela não publicava muita coisa da Marvel, mas trouxe alguns títulos. As más línguas dizem que a Pandora não pagava pelos direitos autorais de muita coisa que publicou aqui. No entanto, Rio de Sangue teve capa exclusiva desenhada por Roger Cruz, um dos ilustradores brasileiros mais bem-sucedidos da época. Então, a Pandora deve ter pago pelo menos alguma coisa para ele, porque só trouxa trabalha de graça. O problema é que a capa não conduz muito com a história, uma vez que Wolverine não veste seu clássico uniforme amarelo e azul nela. Mas, nesse ponto, compreendo que foi uma escolha comercial, pois ver o herói com seu uniforme na capa é mais atrativo para o eventual leitor. Entretanto, o vilão que ele enfrenta na capa não tem nada a ver fisicamente com o vampirão vilão da revista, Cyrus Leviticus.
A HQ em questão tem roteiro de Joe Casey e é ilustrada por Oscar Jimenez, que é um artista espanhol de quadrinhos. A Marvel bem que poderia ter usado um desenhista brasileiro para fazer a arte do quadrinho, pois seria mais simbólico, mas Jimenez manda bem nos desenhos. Rio de Sangue está longe de ser uma grande história do Wolverine, mas podemos isentá-lo dessa.
A história inicia-se com Wolverine chegando no Rio de Janeiro para passar uns dias no Carnaval. Logan na verdade gosta muito da Cidade Maravilhosa e até se recorda que passou um ano nela e sempre quis voltar. Dessa vez, ele voltou para fazer turismo sexual, como logo se verá. Tem até um cara com a camisa do Justiceiro descendo do avião com Logan. Naquela época, não tinha frescura de condenar essa camisa. Logan tem um grande amigo na cidade, Tony Vargas, que era dono de boate e depois se tornou delegado de polícia, e o “carcaju” trabalhou como leão de chácara para ele, nos velhos tempos. Até escreveram um samba para ele na época, O Homem do Quebra-Pau.
Wolverine logo fica sabendo que Tony está às voltas com misteriosos assassinatos, com vários homicídios que lembram ataques de vampiros, com cadáveres encontrados sem um pingo de sangue. É claro que há vampiros no Rio; por que não teria? Logan oferece-se para ajudar seu amigo.
Enquanto isso, em uma igreja, somos apresentados ao vilão dessa história, o vampirão Cyrus Leviticus, que está meio decrépito. Apesar disso, ele tem uma teúda e manteúda, Ezra, que por coincidência de roteiro é a ex-mulher de Tony, o amigo de Logan. Leviticus planeja um banho de sangue no Rio de Janeiro, pois a cidade tem uma energia luxuriante, e assim ele poderia ter sua ascensão.
Por sua vez, Wolverine está nesse momento na farra, atrás da mulherada. Só faltava ele invadir o Projac da Globo atrás da mulata Globeleza. Em vez disso, ele vai parar em pleno Sambódromo, se atracando com outra mulata. Atrás dele, não sei se o desenhista quis representar o Charada vilão do Batman ou o Alfred E. Newman da Mad. Só sei que essa ilustração é bizarra, com direito a até um palhaço.
Logan continua à toda no turismo sexual, inclusive com trenzinho com as mulatas. Tem uma mulher em que ele chega que parece que foi inspirada na Cristina Mortágua, a ex-modelo que engravidou do jogador Edmundo, o “Animal”. Bom, acho que tem a ver com o Wolverine, que é meio animal também. Coitada da Mortágua, que ficou irreconhecível na Fazenda da Record.
Depois disso, Logan é abordado pelos “bate-bolas”, tradicional gangue de playboys do Rio de Janeiro. Pelo visto, Joe Casey fez seu dever de casa, pois essa gangue realmente existe na cidade. A mesma coisa na história do Batman no Rio de Janeiro, em que aparecem os “mortinhos”, os moleques de rua cheiradores de cola. Logan não se faz de rogado e parte para cima dos “bate-bolas”, dando uma senhora surra em todos.
No outro dia, ele está de ressaca quando é encontrado por seu amigo Tony. Na realidade, não sei se Logan pode ficar de ressaca por causa do fator de cura, mas enfim. Ele se oferece para ajudar Tony no tal caso dos vampiros.
Entrementes, os tais “bate-bolas” estão se recuperando da surra que sofreram do Logan, quando são visitados por Ezra, que se esgueira na janela. Como eles são burros e não sabem que nunca se deve convidar um vampiro para entrar em sua residência, são todos atacados e vampirizados.
Naquele momento, Logan e Tony passaram o dia todo enchendo a cara, aparentemente se esquecendo da investigação. Quando chegam no apartamento de Tony, encontram Cyrus, Ezra, e um dos “bate-bola” vampirizados, que nocauteia Logan. Como eles entraram sem ser convidados, não é explicado, mas talvez pelo fato de Ezra ser a ex-patroa de Tony eles não precisem de tanta formalidade. Provando que não tem nada pior que ex-mulher, Tony é assassinado por Ezra. Logan acorda e vê o corpo de Tony. Agora é pessoal. É hora da vingança assassina do Wolverine.
Perambulando pelas ruas, atrás de rastros dos vampiros, Logan é mais uma vez atacado pelos “bate-bolas”. Dessa vez, com o auxílio de uma abóbora com gás tóxico. Ele perde os sentidos, e o desenhista aproveita para fazer uma homenagem ao Lanterna Verde da DC nessa página.
Logan acorda na igreja onde Cyrus tem seu esconderijo, e ocorre aquele tradicional monólogo do vilão. Cyrus revela que é vampiro por causa de um simbionte que tem no intestino (bem nojento). Depois, ele sai com os “bate-bolas” para fazer um banho de sangue na cidade. Ezra ainda permanece para fazer um “lanchinho” do Logan, mas ele logo entra em fúria assassina, consegue se soltar das correntes e parte para cima da vampira, que ao fim foge.
Em meio ao Carnaval, Logan sai em disparada para eliminar Cyrus e o resto dos vampiros. Ele enfim topa com os “bate-bolas”, e liquida todos como “aquecimento”. Enquanto isso, Cyrus está esperando o massacre acontecer, mas é frustrado pela chegada de Wolverine, que revela que ele era o último vampiro que sobrou. Ocorre um confronto selvagem, e Logan aproveita para expor o simbionte e extirpar o bicho. Depois é só correr para o abraço e matar Cyrus, empalando o vampirão.
Logan salvou o Rio da vampirada, mas está triste em razão da morte de seu amigo Tony. Ele jura que encontrará Ezra e a liquidará. Ao longe, no galho de uma árvore, ela observa Logan e se vira para o leitor, com um olhar à la Beto Carneiro, o vampiro brasileiro, “minha vingança será maligna”. Mas, até onde eu sei, Ezra nunca mais apareceu em uma história do Wolverine.
Enfim, essa é uma HQ providencial para esse clima de Carnaval. Não dá para dizer que é uma boa história do Wolverine. É de fraca para ruim. Também não é a pior história do personagem. O que não faltam são histórias tenebrosas do Wolverine, sobretudo na última década, em que a Marvel até matou o personagem por um tempo, por causa do rolo com os direitos para o cinema com a Fox. Vale dizer que há uma segunda aventura do Wolverine no Brasil, dessa vez no Maranhão, na graphic novel Saudade, em que ele enfrenta um pai de santo mutante. Essa história é um pouco melhor que Rio de Sangue.
Nenhum comentário