MEMÓRIA EM QUADRINHOS: Técnicas de luta do Justiceiro


Quem é fã antigo do Justiceiro (como eu) provavelmente se lembra de alguns “extras” que eram feitos com o personagem em suas histórias antigas, publicadas no final dos anos 80 ou início dos anos 90. Por aqui, essas histórias foram publicadas na Superaventuras Marvel ou na revista mensal do Justiceiro em formatão e preto e branco da Abril. Esses “extras” eram as tais “técnicas de luta do Justiceiro”, em que era detalhada toda a perícia marcial de Frank Castle. 

Tradicionalmente, o Justiceiro prefere despachar bandidos vagabundos para o Inferno os fuzilando, pois é mais eficaz e limpo. Porém, se necessário, ele também manda os meliantes para o além com as mãos nuas. Inúmeras vezes, o personagem quebrou o pescoço dos bandidos, e até mesmo matou um enfiando o punho fechado em sua boca e depois abrindo a mão. Nas histórias antigas do Justiceiro, era sempre divertido ver como ele mataria alguns criminosos da forma mais criativa ou violenta possível.

Por exemplo, aqui temos uma demonstração de como o Justiceiro mata um bandido maromba, usando de contorcionismo para quebrar seu pescoço. Essas técnicas de luta eram até bem detalhadas.

Outro exemplo é o Justiceiro bloqueando o ataque de chutes de um membro da Tríade, com uma perícia que rivaliza com a de Bruce Lee.

Mais uma demonstração das capacidades de luta de Frank Castle, quando ele bloqueia o ataque desse vagabundo e logo depois o faz mamar direto no Capeta, com a própria faca que o meliante estava usando.

E o Justiceiro ainda se lembrava dos tempos em que passou na Ilha Ryker e como ele se exercitava lá, com os outros detentos. No pain, no gain.

Inclusive, um dos parceiros de treino do Justiceiro era seu saudoso sidekick, Microchip. Se fosse hoje em dia, provavelmente o personagem seria acusado de gordofobia, por abusar do gordinho do Microchip.



E ainda havia a descrição do condicionamento físico do Justiceiro, que não era o condicionamento físico nutella de hoje, à base de shake. Com ele, o sistema era bruto.

Com o tempo, esses “extras” das técnicas de luta passaram a desaparecer, creio que não apenas porque saturaram um pouco, mas também porque a Marvel começou a temer que os jovens e impressionáveis leitores do Justiceiro passassem a tentar usar as técnicas em seus amiguinhos, o que é uma grande bobagem. Eu não sou um grande especialista em brigas, mas sei que a melhor forma de aprender a brigar é brigando. E não lendo gibi de brigas, apesar de que a ação do gibi pode proporcionar algum conhecimento teórico.


Quando eu era moleque, não era muito de me meter em brigas, graças a Deus. Foram raras as vezes em que isso aconteceu. Claro que havia os babacas da escola, mas nunca tretei muito com eles, nem eles comigo. Eu era mais o nerd introvertido, mas não sofria tanto bullying. Mas, mesmo se sofresse, não sei se iria adiantar usar as técnicas de luta do Justiceiro. Talvez conseguisse acertar um golpe ou outro. Também quando eu era moleque, havia umas revistinhas que ensinavam o Jeet Kune Do de Bruce Lee. No entanto, aprender o estilo de Bruce no manual com certeza não é a mesma coisa que aprender empiricamente.


E, a bem da verdade, as técnicas de luta do Justiceiro eram o menor dos problemas. A Marvel também publicava edições especiais com descrições bem detalhadas do arsenal de personagem. Com o tempo, ela parou de publicar provavelmente por medo de ter problemas. E olha que armas são legalizadas em vários estados dos EUA e o politicamente correto naquela época não era tão forte como hoje em dia. Não deixa de ser hipocrisia a Marvel ter escrúpulos de lançar publicações com as descrições das armas do Justiceiro, mas ainda hoje a gente pode ver descrições até mais detalhadas em jogos de videogame como Metal Gear Solid ou Counter Strike.

Entretanto, a pergunta que não quer calar é: será que as técnicas de luta e as descrições do arsenal do Justiceiro poderiam voltar a ser publicadas na atualidade? A resposta é muito provavelmente não. O conselho editorial da Marvel hoje é composto por lacradores e nutellas que não gostam muito do Justiceiro e não têm muito ideia do que fazer com o personagem. A realidade é até mais dura: a Marvel acha os fãs do Justiceiro uns bostas. Não é o tipo de fãs que quer “cultivar”. Tanto que o editor-chefe atual, C. B Cebulsk é praticamente só um pau mandado da vice-editora, Sana Amanat, que foi posta na Editora pela Disney e que implementou a agenda lacradora por lá.

É preciso entender que a Marvel sempre soube surfar nas ondas do momento. Se nos anos 80 e 90 havia a cultura dos brucutus de ação de Stallone e Schwarzenegger, hoje em dia existe a cultura do politicamente correto e da lacração, e o Justiceiro é um personagem problemático para a editora.

A questão é que o Justiceiro atualmente não é um grande “ativo” para a Marvel. A empresa na atualidade privilegia o cinema e o streaming como mídia, principalmente após ser adquirida pela Disney. Os direitos do Justiceiro estão com a Netflix, por causa da série no streaming. Entretanto, ainda que não estivessem, a Marvel/Disney fica pisando muito em ovos em como trabalhar em um personagem que muitos consideram “fascista”. E pior que alguns acontecimentos recentes deixaram o Justiceiro ainda mais na berlinda, como um policial vestindo a camisa do personagem em um protesto contra o Black Lives Matter, o que causou o cancelamento do Justiceiro por seu próprio criador, Gerry Conway.


Ademais, o símbolo do Justiceiro passou a ser usado por militares e agentes de forças de segurança nos EUA. Um exemplo é os fuzileiros com capacetes com a caveira do personagem no Iraque. Fato que foi demonstrado no filme Sniper Americano de Clint Eastwood. Até no Brasil, o símbolo é adotado por policiais e até mesmo bolsonaristas, como se viu na última eleição. Eu mesmo estava andando ano passado no shopping com uma camisa do Justiceiro e encontrei um amigo, digamos assim, comunista, que fez observações a respeito da minha camisa. Recentemente, depois do Natal, meu irmão esquerdista progressista veio aqui em casa e ficou me enchendo o saco, ao me ver com a camisa do Justiceiro. Eu acho abuso e, quando alguém faz isso, mando logo tomar naquele lugar.



Infelizmente, hoje em dia, o Justiceiro é quase um personagem B na Marvel. Ele tem uma base fidelizada de leitores, mas não tem a mesma importância de antes. Apesar disso, a revista do Justiceiro ainda vende mais do que a da Capitã Marvel, que vive na nota de corte do cancelamento. Entretanto, o Justiceiro nos anos 90 chegou a ter três revistas mensais, para ver o quanto o personagem vendia: PunisherPunisher War Journal Punisher War Zone. Tendo-se uma base de comparação, na época, Batman, Superman e Homem-Aranha, que são os super-heróis mais populares, tinham quatro revistas mensais. Sem contar as três produções cinematográficas, com Dolph Lundgren, Thomas Jane e Ray Stevenson, e a série da Netflix, com Jon Bernthal.

Em suma, infelizmente, nesses tempos nutellas que estamos vivendo, não há mais margem para fazer mais “extras” divertidos como as técnicas de lutas ou a descrição do arsenal do Justiceiro, porque o personagem não é valorizado e seus leitores são desprezados pela Marvel. Mais um caso patente de ingratidão para quem por tanto tempo ajudou a mantê-la. Na época das “palavras ferem” e do “direito dos manos”, você não verá muita ação.


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